segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Arena galeria

  Quando entrei na Arena da Campus Party pela primeira vez, o apelo visual do que eu vi foi como me arrebentar contra uma parede de tijolos. O espaço, tomado por bancadas e palcos, estava repleto de luzes coloridas, construções de latas de energético, placas, estandartes, adesivos colados em toda superfície possível misturando frases de efeito e logomarcas, pixações, post its com mensagens nas colunas, cartazes de todo tipo, desenhos de fita crepe no carpete. O som de palestra-show-ventilador-máquina-grito. O visual das pessoas, cheios de referências científicas e de cultura pop misturado com chinelo de dedo e pijama. Existe uma super estimulação visual e auditiva na Campus Party que trás a sensação de estar fora da realidade consensual.

Existe uma estética muito própria na expressão das bancadas da arena da CP e das vivências que acontecem dentro da arena. Eu, que passei a vida estudando conceitos estéticos e a estrutura que fundamenta a expressão artística de alguém, fiquei besta em como aquilo acontecia. Em como esse espaço que por alguns dias é a casa/trabalho/lazer desse monte de gente podia ser também algo que tinha o cheiro de uma zona autônoma temporária, e abrigar uma necessidade de expressão estética tão intensa. A Arena da Campus é uma extensão das expressões de arte urbana, de intervenção no ambiente. A conversa entre o que é tecnologia de ponta e o que é questionamento artístico de ponta se entrelaçam, mesmo sem saber.



Duvido um pouco que a maioria das pessoas participando da marcha das cadeiras nessa madrugada conheça o conceito de happening e a história artística disso, o que não impede que a marcha tenha a estrutura de um. A visão das pessoas andando com as cadeiras erguidas sobre a cabeça tem uma força estética inegável, e por mais que possa parecer pura bobagem, extrapolação de flash mob, caos, "coisa de huehue" ou de gente bêbada (entre outras opiniões menos afáveis no twitter), existe sim uma necessidade de expressão pessoal manifesta, que criou uma estrutura visual e performática.
A marcha das cadeiras. Procure no You Tube e veja a piração

Nas bancadas, tanto pelas associações identitárias de grupo como pelas expressões pessoais, essas manifestações estéticas tem uma presença firme que serve até como cartografia. Aparecem desde grafites até instalações complexas, algumas planejadas e outras que vão surgindo de forma espontânea. Os Case Mods são o exemplo mais pontual de expressão artística planejada. Os objetos decorativos que as pessoas trazem, pelúcias, action figures, banners, bandeiras e estandartes, são um outro grau de expressão planejada, mas que tem menos auto consciência artística. A maioria das pessoas não se vê como produtor criativo quando trás seu bicho de pelúcia para colocar em cima da CPU, mas a exposição disso de forma pública é uma expressão criativa.  

Acho importante explicar esse conceito: você não precisa ser artista para se expressar criativamente. O processo de expressão é natural ao ser humano, e dado o espaço para que isso ocorra, as pessoas vão usar métodos associados à arte tradicional para se expressar.

Entre as manifestações menos planejadas estão as reações das pessoas aos objetos e propagandas distribuídos no evento. O adesivo do canal Syfy colado em todo lugar possível e imaginável, muitas vezes desmontado e remontado para formar outra imagem. Adesivos usados para formar as linhas de um complexo desenho abstrato dentro da porta de um reservado no banheiro. A decoração de CPUs e notebooks com os adesivos distribuídos. A escolha de como organizar as coisas em cima da bancada, formando um espaço seu, único e pessoal. 

A certa altura, para se localizar, coisas como "perto da bandeira da Horda" "a esquerda da bancada com o cone", ou "aquele pc com um cachorro em cima" vão criando a cartografia, o mapeamento mental e afetivo do evento. As pessoas reconhecem essas manifestações e as observam, mesmo sem perceber o valor expressivo do processo.

Se existe um aspecto das vivências da CP que merece uma atenção particular de quem vem, é esse. Por um lado, observar o que é feito. Muita coisa ali pode ser usada como intervenção no mundo aqui fora. Por outro, pensar, o que eu estou fazendo? Qual é a minha expressão nesse espaço? E, se eu tenho uma mensagem para passar, será que não vale a pena assumir essa ação criativa de guerrilha e começar a também intervir nesse lugar?

Sabe o que é isso? O Sarau da Campus, que rola todas as noites.



(esse texto foi produzido na oficina #EscrevinaCampus, mediada pela Cláudia Ideguchi, e como todo texto de oficina, está aberto a críticas estilísticas. Esse blog vive em constante busca de identidade, e comentários ajudam)

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Hefesto, Hermes e a CPBR8

Eu ia escrever um post super cabeça a respeito de narrativas, mas nessa madrugada caiu a ficha do povo de que a Campus tá acabando e que precisa ser curtida até o fim, e o nível de caos chegou a níveis que me impedem de pensar com clareza em qualquer coisa que não seja o momento presente.

E foi assim que rolou uma libação de guaraná Jesus e uma oferta de M&Ms para Hefesto e Hermes, porque apesar de tudo eu sou uma pessoa irritantemente religiosa.

Quando a gente pensa nos deuses, a gente tem duas opções: parar no tempo, ou tocar o barco em frente e enxergar a presença deles nas coisas dos nossos dias. Afinal, era isso que os antigos faziam. E ai, quem é responsável por essa porra toda?

Hefesto é o senhor da Tecnologia. Pertenciam a ele todas as tecnologias de ponta da antiguidade, representadas na forja e em toda técnica de manufatura. Hefesto no meu altar tem entre os objetos que ofereci para ele, junto com uma miniatura de bigorna, uma placa de memória RAM. Hefesto é o deus que mobiliza as mãos de uma pessoa que monta uma impressora 3D, que sopra no ouvido do cara debruçado em cima de aprender a lidar com Arduíno, que anima o fulano fazendo um casemod. Hefesto é um deus do hardware, da máquina, da robótica, mas também está na tecnologia de software que permite isso tudo funcionar, do mesmo modo que para os gregos, era aquele que criava beleza com a decoração precisa de um objeto eficaz. Porque para os antigos helenos, não basta ser útil, tem que ser belo, tem que ser bacanudo.



Hermes é o trickster, o senhor da trapaça, e o deus mensageiro. Comunicação, e ainda mais comunicação rápida, é o território de Hermes. Ele é quem senta do lado e observa enquanto mensagens são trocadas e contatos são feitos, a cada troca de cartões de visita e desconhecidos que sentam juntos para resolver alguma coisa.  Ao mesmo tempo, scams, spams, pirataria de dados, tudo isso entra nas tramas de trapaça que o filho de Maia abençoa.  Tanto a bagunça que permeias a arena, a bagunça idiota e a que está cheia de caos criativo, quanto as rodinhas de gente discutindo seriamente debruçadas em torno de uma discussão ética ou da resolução de um problema técnico tem a benção de Hermes. Viajantes de todo lado chegando e se concentrando, o que poderia ser mais favorável à presença de Hermes?


Claro que podemos olhar por outros deuses. A Campus B é território de Dionísio até certo ponto, e de Ate, a deusa da insensatez, depois disso, que ela com certeza tá dormindo no sofá aqui na CP. Apolo, sendo o deus daquilo que acerta de longe, tem seu espaço garantido aqui por motivos de programas fazerem isso. Zeus, senhor da ordem e da eletricidade, alfa e ômega, torna possível a porra toda.




quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Mais um dia de Campus...

... não que o dia tenha acabado.

algumas anotações avulsas:

*Uma coisa que eu acho muito curiosa na Campus é que apesar de estar abarrotada de nerds usando camisetas e acessórios e coisas e máquinas decoradas com seriados/games/filmes/livros que tem fandom bem presente aqui no Brasil, a porcentagem de figurinhas carimbadas, gente que você encontra nos eventos nerds, é bem menor do que o esperado. Não é que não encontre, a gente encontra vários, mas são comparativamente poucos.

*Se tem um lugar onde não tem um padrão visual predominante, é esse. Não tem como vcoê dizer "um campuseiro é assim". Existem elementos que vão predominar em qualquer lugar onde as pessoas estejam morando por uma semana, como mais chinelo e menos tênis (e a cada dia mais chinelo), uma predominância de gente com mochila nas costas (porque você fica carregando as coisas de um lado pro outro então né), mas não existe um padrão majoritário. Tem uma quantidade crescente de mulheres (inclusive palestrantes) a cada ano, mas ainda acho que poderia ser mais.

*Conforme os dias passam, as pessoas vão ficando mais amistosas. Puxar papo vai ficando mais fácil, as pessoas se enfiam na conversa das outras e esses papos se esticam por um tempão, vai rolando uma camaradagem maior entre as pessoas em uma mesma bancada. Cria uma familiaridade.

*A sensação de tempo fora do tempo, de estar em Nárnia, de mundo a parte, é uma coisa que eu escuto um bocado de gente comentar.

*Vou parar de viajar aqui e tocar o barco. Você sabia que se produz mais conteúdo do que se consome, aqui? O upload é muito maior que o download.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Campus Party Brasil 8

Explicar o que é a Campus é impossível. A versão oficial é a que está na página do evento, não preciso repetir isso. Com 8 mil pessoas aqui dentro, é fácil perceber que existem muitas formas de perceber o evento e muitos públicos diferentes aqui.

Não posso falar pelos outros, só por mim. A CP é o momento que inicia meu ano mental. Onde eu saio de uma realidade onde as pessoas estão em um universo onde escuto minha superior hierárquica dizer que "escola não é lugar de tecnologia" e os professores tem pavor da ideia de fazerem qualquer coisa que envolva um tablet ou um pc, mesmo que fiquem conectados no facebook e no whatsapp o dia todo. Mas quando eu falo de uso pedagógico do Facebook, sou olhada como se eu fosse a Horta tentando me comunicar com o Spock.

Uma pessoa disse que só alguém que usa drogas estranhas acampa na CP se puder evitar. Eu gosto, não tive problemas (mentiraaaaaa, um arame atravessou o chão da barraca e esfaqueou nosso colchão inflável e a regra tem sido dormir no colchão cheio, feliz e confortável e acordar no chão. mas foi só isso.) . O conceito de imergir me agrada. Eu estou em Nárnia, que é uma Narnia que tem um bocado de problemas, mas também tem um enorme potencial de maravilhamento.

Aqui eu posso assistir palestras e mesas e debates sobre N assuntos que pautam meu ano, em amplos aspectos. Com o bônus de que aqui tem música, tem cineminha, tem bagunça, tem manifestações estéticas e um potencial de TAZ.

Chegamos na terça a noite, depois de uma série de desventuras que Murphy põe na nossa vida. Mas ok, a terça foi bem vazia porque esse ano tem um dia a menos de CP, então a terça foi o dia de abertura dos portões. Hoje peguei algumas palestras bem interessantes, que me colocaram pensando. O tema comum? Narrativas. Narrativas para todo canto.

Tenho uma efervecência na mente. Agora vou dormir porque o dia começa cedo e só termina sabe se lá quando... porque a coisa aqui rola 24 horas.