Domingo, 8 de março, aconteceu o Primeiro Encontro de Mulheres RPGistas. Tem muito o que foi escrito sobre o que motivou o encontro, sobre toda a escrotice machista que é uma constante no meio nerd.
Mas o que alimenta meu coração é pensar em como foi um dia bom. Em como eu vi mulheres falando, fazendo e existindo, sendo elas mesmas, em um ambiente que não é hostil.
Estava lotado. Cada milímetro da Terra Magic estava tomado de gente. A primeira coisa que me chamou a atenção foi que em pleno fim da manhã de domingo, as pessoas estavam em uma roda de discussão sobre a exclusão sistemática das minas no meio do RPG, das situações dantescas e dos preconceitos que passamos. Eu nem consegui entrar na sala, assisti parte da conversa ali no corredor.
Desci as escadas, fui fumar um cigarro, e lá estava um rapaz, conversando com outro, dizendo que nunca tinha imaginado aquelas coisas, que precisava falar com as minas do grupo de jogo dele, para ver o que de cagado podia ter feito sem perceber, e como poderia agora consertar, tornar o grupo de jogo um ambiente mais saudável. Vi e ouvi muitas reações assim. Os caras estavam ouvindo, e ficaram estarrecidos de se dar conta das cagadas.
Eu não sou muito de jogar em evento. Não escuto bem, então é difícil conseguir me concentrar. Já mestrei muito em evento, mas se tenho a opção, gosto mesmo é de conversar com as pessoas.
E foi o que fiz a tarde toda. Falamos de boardgame e RPG, de cardgame e de preconceito, de machismo e intolerância religiosa, de café e de educação, de pedagogia e pobreza, trocamos histórias. Foi muito bom, produtivo e divertido. E enquanto isso, as mesas de RPG rolavam, e era bonito ver as mulheres mestrando, atuando, se divertindo.
Um dos pontos que para mim foram mais fantásticos foi o fato de o evento ser amigável para famílias. Não adianta, um evento inclusivo precisa ter em mente que as pessoas tem filhos, e muitas mulheres acabam sendo excluídas de participar por isso.
O número de vezes que a gente teve problemas para carregar o pequeno em eventos, sabendo que o fato de dividirmos de verdade as tarefas entre dois cuidadores e termos amigos dando suporte sempre nos deixou em posição vantajosa, e mesmo assim sempre foi operação de guerra, me torna extremamente solidária. Acho que todo evento precisava pensar nisso. Porque é um pedaço enorme do público que acaba sendo excluído, deixando de participar porque tem filhos. E o encontro lidou lindamente com o assunto. Foi um exemplo a ser seguido por todos os encontros nerds.
E teve muita coisa que ficou na minha cabeça. De como as opressões cotidianas se infiltram naquilo que a gente faz. De como uma mesa de RPG pode ser libertadora e questionadora, ou só uma repetição do status quo. De como é difícil que as pessoas entendam que não existe um estereótipo de "mulher rpgista" de "mulher nerd", que somos rpgistas, assim como os caras, de todos os tipos, que o que nos define é nossa individualidade. Não existe o jeito de jogar que as minas gostam, o tipo de jogo que as minas gostam, e que se muita menina se interessou por RPG na época do storyteller foi por ser um jogo com mais representatividade e menos chainmal bikini, não pelo estilo ou tema. Foi só porque a gente não era sistematicamente excluída de participar só por ser menina. (e eu comecei com D&D, vale dizer).
Representatividade. Acho que essa é a palavra para esse encontro e tudo que ele ainda vai gerar.
E vai gerar muita coisa. Colocou engrenagens em movimento que o pessoal nem imagina ainda.
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